08 outubro 2010

O Rei Que Era Um Melão

Um dia, o monarca de um certo país, na ânsia de impressionar a multidão, decidiu mandar construir um arco triunfal para, montado em seu cavalo, passar sob ele com toda a pompa  e circunstância.
Mas quando chegou o grande momento, sua coroa esbarrou no arco  e foi ao chão. Ao que parece, o arco havia sido construído baixo demais.

Por isso em sua cólera, à qual tinha todo direito, o monarca ordenou que enforcassem o chefe dos construtores. De acordo com a ordem, a forca foi preparada. Mas, enquanto levavam o chefe dos construtores ao lugar da execução, este gritou  que na verdade, tudo era culpa dos trabalhadores negligentes, pois eles é que tinham feito o trabalho.

Como o rei possuía um senso lógico de justiça, chamou os trabalhadores para prestarem declarações.  Mas estes se eximiram da acusação explicando que quem tinha feito os tijolos os tinha feito pequenos demais. Os fabricantes de tijolos, por sua vez, explicaram que apenas haviam cumprido as ordens do arquiteto.



Ao ser chamado diante do rei para prestar depoimento, o arquiteto lembrou ao soberano que, na última hora, sua majestade fizera, com suas próprias mãos modificações nos planos, e que isto havia alterado as dimensões.

"Tragam o homem mais sábio do país" - ordenou o monarca - "pois tenho aqui sem duvida, um problema e preciso de um conselho ilustre."

O maior dos sábios foi carregado até a sala de audiência, pois não conseguia andar, tão avançada era sua idade e, portanto, tão grande sua sabedoria.

"é evidente" - disse, quando lhe foram expostos os fatos - "que, por justiça, o culpado deve ser castigado e, neste caso, evidentemente, o culpado é o arco."

O rei aplaudiu sua decisão e, após cobri-lo de presentes e honrarias, em reconhecimento  por sua sabedoria, ordenou que o arco triunfal fosse transportado para a forca.

Mas, enquanto estava sendo levado para lá, um dos conselheiros reais observou que, afinal, aquele arco era algo que, embora inconscientemente, tocara a cabeça real. Insistiu em que de forma alguma deveria ser aviltado a ponto de ser posto diante da corda de execução, pois tal acontecimento poria em risco a supremacia real.

Nesse meio tempo, esgotado pelo esforço despendido, o venerável sábio havia exalado seu último suspiro, e já não era possível recorrer a ele para que interpretasse esta inesperada observação, mas o público clamava por justiça contra o agressor do rei, fosse quem fosse.

Ao mesmo tempo, os doutores da lei, que estavam deliberando, chegaram à conclusão de que a parte inferior do arco, conforme se sabia, não havia tocado absolutamente em nada, e muito menos na cabeça real, conscientemente ou inconscientemente, mas deveria ser enforcada, pagando assim pelo crime cometido pela parte superior, baseando-se na doutrina da responsabilidade coletiva.

Porém quando o carrasco tentou colocar aquela parte do arco no seu laço, verificou que a corda era curta demais. Como não podia deixar de ser, o fabricante de cordas  foi chamado para prestar depoimento, mas logo explicou que, na sua opinião, a forca é que era alta demais. E sugeriu que os carpinteiros fossem trazidos para prestar contas.

"A multidão está inquieta e impaciente" - falou o rei - "portanto devemos encontrar rapidamente alguém a quem enforcar. Podemos facilmente adiar os detalhes sobre os carpinteiros e os fabricantes  de corda até um momento mais propício e menos tenso."

"Seu menor desejo é para nós uma ordem" - replicaram os cortesãos.

Em tempo surpreendentemente curto, todas as pessoas da capital do país tinham sido medidas e descobriu que havia apenas um indivíduo suficientemente alto para ser colocado no cadafalso, ao qual se ajustava perfeitamente. Era o próprio rei. Na verdade, ele fora nomeado rei devido à sua aparência imponente. Tamanho foi o entusiasmo e alívio por terem descoberto a pessoa adequada, que o rei teve q concordar...

E, de acordo com o requisito democrático "o homem adequado no lugar adequado", enforcaram-no.

"Ainda bem que encontramos alguém, e solucionamos o problema!" - exclamou o primeiro-ministro, dirigindo-se aos colegas. - "Porque, caso o apetite das pessoas não fosse satisfeito, elas sem dúvida teriam se rebelado contra a própria coroa."

Mas havia outros assuntos urgentes a considerar, pois quase ao mesmo tempo perceberam que quem morrera fora o rei. Os arautos então anunciaram nas ruas:
"O primeiro homem que passar pelas portas da cidade decidirá quem será nosso próximo excelso governante."

Acontece que o primeiro homem que passou diante da delegação de testemunhas reunidas para a ocasião era um idiota. Era muito diferente dos cidadãos sensatos e comuns com que nos familiarizamos nesta história.  Mas lei é lei; e se aproximaram dele.

Quando os membros da comissão lhe pediram que indicasse o futuro rei, ele disse imediatamente

"Um melão."

Isto porque sempre respondia "um melão" quando as pessoas lhe faziam perguntas,  Na verdade, quase não pensava em outra coisa, pois adorava melões. Mas este não é o ponto.  Como em qualquer comunidade saudável, não se tratava de saber como ele chegara à sua decisão, e sim o que havia dito e que acreditava no que havia dito.

E foi assim que um melão, escolhido entre uma pilha de melões com a devida cerimônia e com a reverencia apropriada, foi coroado rei.

Isso se passou há muitos e muitos anos, Hoje, quando alguém pergunta aos habitantes daquela terra por que seu rei parece ser um melão, eles sabem a razão e respondem:

"Por causa da aplicação tradicional da eleição, de acordo com o costume. Sua majestade, evidentemente, deseja ser um melão e, certamente, permitiremos que continue sendo, até  conhecermos seu próximo desejo. Em nosso benigno sistema, ele tem o direito de ser o que quiser. Nós, naturalmente, estamos satisfeitos com isso, desde que não interfira em nossas vidas.

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